quarta-feira, 13 de abril de 2016

Quando o cancro chega sem pedir licença...

A primeira vez que fui confrontada com o "bicho" (prefiro chamar-lhe assim!) foi em finais de Abril de 2008. Fiquei sem chão! Não sabia bem o que era. Sabia que havia a quimioterapia, a radioterapia, as cirurgias, mas não sabia os sintomas, efeitos do tratamento, não sabia nada. Logo que fui confrontada com essa ideia de ser obrigada a lidar com o bicho, passei muito tempo na internet à procura de respostas. E, só depois de ler muito, aprendi a ajudar a minha família e a mim própria.
Ele entra na nossa vida e não pede licença. Entra de forma silenciosa. Não bate à porta. Não tem educação. É cruel, é falso, é estúpido. Não olha a idades, a cor, a condição social. Entra e pronto. Destrói famílias, mas une ainda mais outras, ensina-nos muitas coisas, faz-nos questionar a nossa missão no mundo.

Vem a fase dos tratamentos... Cada dia é um dia. Se num dia estamos bem, no outro podemos estar mal. Se num dia sorrimos, no outro podemos ficar com medo. À frente da pessoa que luta, parecemos sempre estar bem, mas quando nos isolamos muitos pensamentos passam pela nossa cabeça. O grande desafio está em conseguir eliminar esses pensamentos menos bons e revertê-los só em coisas boas.

Durante este processo todo é extremamente importante a alimentação: é preciso não alimentar o bicho. E ele alimenta-se de açúcares. Por isso é preciso evitá-los. É preciso apostar em produtos naturais, em legumes, em fruta (tudo muito bem lavado!), em sumos de beterraba. É preciso ser-se positivo, ou aprender a ser positivo. É preciso ter fé na cura, em Deus, ou, em algo superior. É preciso ser-se corajoso, não ter medo de agulhas, ou pelo menos "suportá-las" (pois passam a ser o "prato do dia"!) e ser bastante otimista. E, por fim, também é preciso ter sorte! Muita sorte!

É durante esta caminhada difícil que essas pessoas se  tornam guerreiras, pois conseguem superar todas as dificuldades. É aqui que nos agarramos a tudo: Todos os Santos, Espírito Santo, Jesus, Maria, Deus,... Lembro-me que tínhamos um altarzinho cheio de imagens e velas, onde rezávamos. Tínhamos orações que toda a família rezava todos os dias, em vários pontos do mundo. Tínhamos muita fé e esperança de que o bicho ia desaparecer.

É nestas alturas que descobrimos quem são os nossos verdadeiros amigos. Quem está lá sempre para nós. Com quem podemos contar. Também descobrimos quem são aqueles que não interessam. Aqueles que não fazem falta nenhuma. Aqueles que são apenas "número" na nossa vida. E sabem que mais?! Ainda bem. Lembro-me sempre de uma conversa que nos foi dita na 1ª consulta (naquela em que tivemos a confirmação de que o bicho existia): "Isto vai ser como entrar num comboio que vai parar em várias estações e na carruagem só vais colocar pessoas que te fazem bem, o resto deixa para trás. O objetivo é chegar à última estação: a da vitória." E, é mesmo assim que funciona!

Depois dos tratamentos, há quem consiga dar um KO no bicho. E há quem não consiga e, mesmo assim continuam sendo guerreiros. Afinal de contas não é qualquer um que consegue enfrentá-lo de peito aberto disposto a tudo. E eu tive a felicidade de conhecer tanta gente com essa força, mas, infelizmente, com pouca sorte. Gente com mais ou menos idade. Os de menos idade sempre custa mais aceitar. Que Deus os tenha junto de Si. Mas também conheci gente que o enfrentou e que conseguiu derrubá-lo com distinção. Uma dessas pessoas foi o meu irmão. Graças a Deus que assim foi. Normalmente vamos sabendo apenas dos casos de insucesso. Os casos de sucesso nem sempre conhecemos. E eu acho que é importante para as pessoas que estão em tratamentos saberem que também existem finais felizes e que é possível vencer. É importante que alguém que já esteve em tratamentos se disponibilize e vá dar o seu testemunho a quem está em tratamentos para eles verem com os seus olhos que podem também conseguir. Tenham força e fé!

A 28 de Janeiro de 2009 eu recebi a melhor notícia da minha vida até àquela data. Foi como se tivesse ganho o primeiro prémio do Euromilhões. Estava rica, milionária. O tormento ao fim de 10 (longos) meses tinha terminado (pensava eu!)... Seguiram-se dias muito felizes. Mas o tormento nunca mais termina. Claro que já não será no dia-a-dia, mas a cada proximidade dos exames de rotina o medo toma conta de mim, de nós. Ninguém comenta, mas eu sei. Todos pensam nisso. Todos têm medo. Todos rezam com mais afinco. Os exames de rotina são uma espécie de relembrar o quão frágeis somos. Que devemos agradecer todos os dias a graça de estarmos vivos e juntos. Eu agradeço a Deus todos os dias a graça que é ter o meu irmão na minha vida. Obrigada Deus! Mais uma vez confio em Ti.

A vida nunca mais volta a ser a mesma... Maldito bicho!...

4 comentários:

  1. Bj grande Vera :) adoro os teus textos...escreves com alma

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    1. Muito obrigada querida! Escrevo o que me vai no coração, deve ser isso... ;)

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  2. Gostei muito de ler o teu texto. Beijinhos

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