quinta-feira, 16 de junho de 2016

O dia que fiquei sozinha em Lisboa

Já estava em S. Miguel quando me ligaram a dizer que tinha ficado colocada na UAL (Universidade Autónoma de Lisboa). Nesse momento senti um misto de sensações: por um lado fiquei feliz e aliviada, porque como recusei as outras 2 universidades a que me propus (para quem não leu a história está aqui), ao menos tinha corrido o risco e tinha corrido bem! Mas depois da felicidade inicial veio a pergunta "E agora?! O que faço agora?!"
Tinha plena consciência que tinha de partir para Lisboa, que tinha de deixar para trás os meus pais e irmão, com quem nunca soube viver sem. Lisboa, não era só uma cidade. Era a capital de Portugal. Era a grande metrópole do país. Já tinha ido lá de férias com os meus pais e irmão, quando tinha 10 anos e há uns meses quando fui fazer os exames de admissão, portanto tinha visto como era grande. Como é que eu ia ficar lá sozinha?! Não sabia...
Depois desse telefonema, tive de apressar tudo. As passagens, na altura, comprei-as (os meus pais, no caso!) na Agência de Viagens AVA, que já não existe. Era uma para mim sem regresso marcado e outra para o meu pai com regresso marcado dali a uma semana. A minha mãe pediu ajuda ao meu primo P. para ver se haviam quartos para alugar numa zona que fosse boa. O meu primo estava a estudar em Lisboa e foi 5 estrelas connosco e comigo enquanto estivemos lá juntos. Descobriu um apartamento de um Psiquiatra em Alcântara, muito próximo da universidade onde ele estudava (Instituto Superior de Agronomia). No apartamento viviam outras estudantes, de várias Universidades, mas na altura apenas uma estava na casa, a R., que também era açoriana. Teria de dividir o quarto com ela, pois além de ser mais barato, o resto da casa (mais 3 quartos) estava quase toda ocupada (exceto um deles, acho). Eu aceitei e os meus pais também...

Hora de preparar a mala para uma das viagens mais difíceis da minha vida...
Lembro-me desse dia como se fosse hoje! Depois de fazer o check in, ter de dizer adeus à minha mãe e ao meu irmão "até um dia que desse" não foi fácil... Sei que chorei muito... Lembro-me que o meu pai abraçou-me e levou-me até à segurança do aeroporto e sala de embarque sempre me dando muito apoio. Eu fui sempre a chorar... Lembro-me de estar em viagem no avião ainda a chorar. Eu não conseguia parar! :(

O meu pai ficou comigo uma semana... Fiquei a dormir com ele no Hotel AS Lisboa. Fomos tratar da matrícula e restantes papéis necessários, assim como fomos conhecer o tal apartamento onde ia morar. Ficava na Rua Luís de Camões, em Alcântara, entre um mini-mercado e um café. Mais abaixo havia uma frutaria e um cabeleireiro no outro lado da rua. No fim da rua ficava o quiosque onde mensalmente eu passei a comprar os passes para andar nos transportes públicos. Existiam também alguns restaurantes e bares. Aliás, ficava a 8 minutos (contados no relógio) a pé das docas de Santo Amaro.
Confesso que quando entrei no apartamento a primeira vez, simpatizei logo com ele, apesar de ser minúsculo. Tudo o que era quarto, o senhorio fez questão de arrendar, por isso eram 4 quartos de dormir, um deles mais pequeno que os restantes, uma cozinha (que devia ser uma dispensa e foi transformada em cozinha - imaginem a pequenez!!!) e um wc. Um dos quartos de dormir dava passagem para um terraço partilhado com a clínica do senhorio e onde os pacientes fumavam (era lá que lavávamos roupa à mão (!!!) - não tivemos máquina de lavar durante 1 ano inteiro - e estendíamos! Às vezes era um bocado assustador! O nosso quarto (meu e da R.) era logo à direita e era grande com uma pequena varanda para a rua principal. 
Conheci a R. e os seus pais nesse dia. Pessoas simpáticas e acolhedoras. Não dormi nessa noite no apartamento, mas logo que instalei todas as minhas coisas no quarto, apesar do meu pai ainda estar em Lisboa, disse-me que era melhor eu ficar no apartamento para me ir ambientando. Eu apenas dormia lá, porque durante o dia ele levava-me à universidade e quando saia ficava com ele até à hora de ir dormir. Ele procurou saber o autocarro que eu devia utilizar para ir para a universidade, fez o percurso de autocarro comigo de casa para a universidade e de regresso a casa. Comprou-me alguns alimentos e outras coisas para eu ter em casa. Até que chegou o dia que o meu pai me deixou no apartamento e teve de partir. Esse foi outro dia que me lembro muito bem! Quando penso nele dá-me sempre um enorme aperto no coração e as lágrimas vêm-me aos olhos automaticamente. Despedimo-nos à porta do prédio. O meu pai não é de chorar, mas sei que ele chorou. Eu pedi-lhe tanto para não me deixar ali sozinha. E sei que ele não me queria deixar ali sozinha, mas não tinha outra solução melhor. Aquilo era o melhor para mim! Entrei no prédio lavada em lágrimas e sentei-me nas primeiras escadas que existiam e o único pensamento que tinha era "E agora?! Eu estou sozinha em Lisboa! Eu não quero estar aqui! Quero ir com o meu pai para a nossa casa! Esta não é a minha casa!..." Foi como se tivesse caído ali de pára-quedas... Chorei tanto, tanto ali naquelas escadas sempre à espera que o meu pai se arrependesse e viesse buscar-me. Ele não veio... Eu limpei as lágrimas e subi as escadas. Quando abri a porta estava a R. e os pais, na mesinha minúscula que tínhamos para comer, e perguntaram-me se estava tudo bem. Eu, novamente lavada em lágrimas, respondi que não e fui para o quarto chorar... Pedi-lhes para me deixarem sozinha. Tinha de assimilar aquela ideia, que tinha de ficar ali sozinha. Acho que nesse dia adormeci a chorar... Não me lembro de conseguir parar...

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